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Redes de Transferência, um laboratório de aprendizagem URBACT para criar competências e promover a coesão na Europa

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18 September 2018
Read time: 5 minutes

Investir em competências e capacidades

Há umas semanas, alguns pesos-pesados espreitaram pelo parapeito da janela. Primeiro, John Bachtler, Diretor do Centro de Investigação de Políticas Europeias da Universidade de Strathclyde, publicou um tweet sobre a importância do Fundo Social Europeu e das competências para colmatar as lacunas inter-regionais. Depois, Andrés Rodiguéz Pose (London School of Economics), Professor e autor de um recente e influente artigo sobre lugares abandonados, reagiu à recente publicação do Banco Mundial sobre o futuro da Política de Coesão como um instrumento para responder às desigualdades regionais na Europa.

Este oportuno relatório do Banco Mundial constitui uma leitura interessante. Uma das suas principais conclusões está relacionada com a criação de competências e, em particular, com a necessidade de investir na capacitação das administrações públicas.

«A segunda implicação de assumir uma abordagem mais "centrada nas regiões" é que a propriedade local deverá ser acompanhada pela criação de competências para permitir que os agentes locais possam planear e concretizar a política regional. A ausência de capacidades a nível local é uma importante barreira ao planeamento e à implementação. Em termos de planeamento, diversas regiões menos desenvolvidas têm realçado que a capacidade de planeamento a nível regional e inferior (por exemplo, municipal) é fraca.»

As razões para investir nos conhecimentos e competências dos funcionários públicos, juntamente com o desenvolvimento organizacional, estão a ganhar força desde há algum tempo. Num cenário movimentado de investigação e atividades, alguns dos contributos que mais se destacam partiram da Demoshelsinki, da OCDE e da NESTA. Esta também tem sido uma questão recorrente nos processos de Planeamento de Ações da Agenda Urbana para a UE no domínio das Parcerias – por exemplo, “Transição Digital” e “Emprego e Competências”. A criação de competências é um dos três pontos principais da proposta de Iniciativa Urbana Europeia, contidos no projeto dos novos Regulamentos do FEDER.

É demasiado cedo para avaliar se isto representa uma rutura com a cultura de subcontratação e de recurso a peritos externos que vigora no setor desde há mais de vinte anos em muitas zonas da Europa. Provavelmente, trata-se de um reequilíbrio. Após anos durante os quais as autoridades municipais se debateram com dificuldades para atrair e reter talentos, há uma sensação de que o pêndulo parou, finalmente – e poderá até estar a mover-se lentamente na direção oposta.

Quinze anos a apoiar as competências dos funcionários públicos europeus para o desenvolvimento de soluções integradas de planeamento urbano no âmbito do URBACT

A mudança é encorajadora, todavia, há ainda um longo caminho a percorrer. Embora seja positivo assistir a um maior debate sobre a importância da capacitação e do reconhecimento do respetivo valor, não existem muitos exemplos do seu bom funcionamento na prática. No contexto deste debate sobre a Política de Coesão, o Programa URBACT tem um importante contributo a dar, pois há mais de quinze anos que apoia cidades, de todas as dimensões, a concretizarem de forma mais efetiva um desenvolvimento urbano sustentável integrado. E quais são as principais mensagens a retirar desta experiência?

Boa parte desta experiência foi recolhida a partir do modelo das Redes URBACT de Planeamento de Ação (APN). Estas redes têm uma extensa experiência na criação de competências municipais para conceber e implementar planos sustentáveis integrados.

Eis cinco importantes lições que moldaram a abordagem:

1. Ouvir as cidades e associá-las estreitamente à conceção do programa

Enquanto programa, o URBACT tem uma relação de trabalho invulgarmente estreita com as cidades participantes – cerca de 500 no atual período de programação. Existe um diálogo e uma partilha contínuos que incluem a utilização de grupos de discussão, inquéritos e outros instrumentos.

2. Sublinhar a importância da aprendizagem entre pares

A nossa experiência apoia a eficácia da aprendizagem entre pares e o apoio entre as partes interessadas a nível urbano. Ter a oportunidade de se pôr na pele de outra pessoa e desempenhar as suas funções noutra cidade é uma excelente oportunidade de aprendizagem. As redes URBACT – e importantes eventos de criação de capacidades, como a Universidade de Verão URBACT – proporcionam uma estrutura de apoio para tal.

3. Criar espaços seguros para aprender, desenvolver confiança e experimentar

Os serviços públicos estão sob pressão para inovar e, simultaneamente, para poupar dinheiro. Um desafio complicado! Os funcionários públicos enfrentam o escrutínio público e os erros nem sempre são aceites com benevolência. O URBACT oferece um espaço seguro às partes interessadas das cidades – principalmente aos funcionários públicos – para aprenderem com colegas de confiança de outros Estados-Membros e aplicar aquilo que aprendem em espaços seguros.

4. Fornecer apoio e acesso a ferramentas e recursos

O URBACT fornece uma metodologia testada e comprovada para apoiar a aprendizagem e criar capacidades, nomeadamente o Kit de ferramentas URBACT, traduzido para vários idiomas da UE, e que oferece um leque de sugestões práticas concebidas para obter melhores resultados. Esta metodologia inclui igualmente eventos de aprendizagem de natureza prática, como a Universidade de Verão URBACT, onde as partes interessadas colaboram com os pares para encontrar soluções para os problemas de uma cidade virtual.

5. Promover a participação e apoiar os municípios com vista a envolver um maior número de partes interessadas

Cada vez mais, a colaboração é a chave para se abordar com sucesso os desafios urbanos. Por toda a Europa, as autoridades públicas trabalham em parceria com as partes interessadas a nível local para conceber e implementar novas soluções - porém, a capacidade e a experiência para trabalhar desta forma é desigual. Desenvolver a confiança e a capacidade dos funcionários municipais de modo a que interajam de forma diferente com cidadãos, ONG e outras partes interessadas a nível urbano é uma dimensão essencial do trabalho do URBACT.

As cidades lideram a adaptação e a transferência de Boas Práticas para outras cidades da Europa

Desde abril de 2018, o programa alargou esta experiência através do lançamento de um novo tipo de rede, as Redes de Transferência de Boas Práticas, que levam mais longe a aprendizagem e a criação de competências.

No centro destas redes encontra-se um exemplo estabelecido de boas práticas urbanas. Ao longo dos próximos dois anos e meio, as cidades Boas Práticas irão liderar uma rede cujo principal objetivo será a adaptação e transferência destas práticas para outras cidades da Europa. Após a finalização da respetiva parceria, estas redes serão compostas por um conjunto equilibrado de parceiros em termos de níveis de desenvolvimento regional. Reduzir as desigualdades e criar espaço para a aprendizagem entre pares e entre cidades de todas as dimensões continua a ser um importante princípio do URBACT.

Entre pares

Neste novo modelo de rede, o paradigma da aprendizagem entre pares foi alterado. Tradicionalmente, as cidades parceiras entravam pela porta de um problema partilhado, mas agora, um parceiro entra com uma solução já pronta, enquanto os outros parceiros partilham o problema para o qual a solução foi concebida. Não obstante, apesar desta distinção, a aprendizagem e a criação de capacidades ocorrem em diferentes níveis para todos os participantes.

A aprendizagem ocorrerá em três níveis principais: pessoal, organizacional e municipal. Além disso, é provável que cada rede baseie as suas próprias experiências de aprendizagem em toda a parceria.

Aprendizagem individual

A nível individual, esperamos que os participantes nestas redes obtenham ganhos significativos em termos de desenvolvimento profissional. Um dos pontos fortes do modelo é o facto de as pessoas estarem a aprender com os seus pares. Os funcionários municipais estão a partilhar as suas próprias perspectivas, a enfrentar desafios familiares e a debaterem formas de os resolver. Além disto, outras partes interessadas de relevo a nível urbano estão a fazer o mesmo.

Aprendizagem organizacional e a nível municipal

Um dos projetos-piloto de transferência centrou-se na transferência de uma política pública integrada de alimentação desenvolvida com êxito em Sodertajle, Suécia. Essas boas práticas envolvem uma longa lista de intervenientes-chave, que vão desde altos funcionários eleitos, até responsáveis pelos contratos públicos, produtores locais de alimentos e pessoal das cantinas escolares. Nos intercâmbios resultantes, cada um participou relatando as respetivas experiências de aprendizagem aos pares de outras cidades. As opiniões sugerem que a identificação precisa das partes interessadas foi um importante fator de contribuição para o sucesso do projeto – atualmente, amplamente adotado noutras cidades da UE.

Este vasto grupo de partes interessadas deverá ser uma característica desta nova geração de redes de transferência. Como o nome sugere, a rede Bee Path, liderada por Liubliana, coloca a conservação das abelhas no coração de um novo conceito de ecologia urbana. Apicultores, responsáveis pelas políticas ambientais e peritos em mobilidade podem estar entre as partes interessadas identificadas em cada cidade. Entretanto, o projeto Cultura para as Alterações Climáticas, de Manchester, explora vias através das quais os setores criativo e cultural possam contribuir para a redução das emissões de carbono, possibilitando a responsáveis artísticos, ONG e funcionários de museus prestarem o seu contributo aqui. Em Badalona, Silver Cities junta idosos, profissionais de saúde e ONG de solidariedade para transferir um modelo de apoio aos idosos para que vivam vidas preenchidas e independentes.

Espaço aberto e fiável

Estes intercâmbios de aprendizagem ocorrem num espaço aberto e seguro criado pelas redes. Ninguém está a vender nada e os parceiros de transferência ouvem a história real, não uma versão romantizada da realidade, uma vez que é muito provável que aprendamos tanto com aquilo que não funcionou como com aquilo que funcionou, num processo de aprendizagem bidireccional. Para quem tenciona transferir as boas práticas, trata-se de uma oportunidade para as ver sob uma nova perspetiva – e para juntar valiosas sugestões sobre como as melhorar ainda mais.

Um laboratório de aprendizagem

Estas redes são uma espécie de laboratório de aprendizagem para todos os envolvidos – incluindo o URBACT, uma vez que o programa as realiza pela primeira vez. Compreender as lições extraídas será muito importante e o programa irá realizar isto através de uma série de instrumentos. Por exemplo, dentro de cada cidade serão designados diaristas da transferência, que irão manter um registo das lições extraídas. A nível da cidade, cada parceiro poderá acompanhar o seu próprio percurso através de um Relatório de Transferência inicial e, em última análise, de um Registo de Aprendizagem final.

Para complementar estes instrumentos a nível da cidade, os Pontos URBACT Nacionais irão organizar eventos em grande parte da Europa para apresentar os resultados, difundir as experiências de aprendizagem ao longo do percurso e, mais importante, procurar promover e incentivar uma onda de aprendizagem. Desta forma, o programa irá atingir uma rede mais alargada de cidades de segundo círculo, alargando a criação de capacidades e as lições.

Política de coesão em ação

O URBACT dedica-se a apoiar a transformação urbana. Em toda a Europa, as cidades enfrentam diversos desafios comuns e, embora não exista uma escassez de "boas práticas", transferi-las com êxito nem sempre é tarefa fácil. As chaves para isto incluem o desenvolvimento de uma profunda compreensão da prática, explorando as possibilidades de adaptação e apoiando a sua eventual reutilização. O êxito da participação das partes interessadas constitui uma parte integrante disto. Proporcionar-lhes apoio – com recurso nomeadamente aos funcionários municipais – é fundamental para esta missão.

Através deste trabalho, o URBACT tem dado um forte contributo para a criação de capacidades para as partes interessadas a nível urbano em toda a Europa. E ao fazê-lo, continua a apoiar a mudança necessária para otimizar a utilização dos recursos públicos e a diminuição das desigualdades entre as regiões da Europa. Aqui temos um exemplo concreto da Política de coesão em ação.

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Texto da autoria de Eddy Adams