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Preparado para negócios? As cidades da Europa e os desafios colocados pela Nova Economia no que respeita às competências

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09 January 2017
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Oito anos após o rebentar da crise financeira mundial, muitas das economias da Europa continuam a arrastar-se, revelando desigualdades ao nível das taxas de emprego e do crescimento empresarial na UE. Existem, obviamente, casos positivos mas, regra geral, a situação continua a ser dececionante.

Como sempre, a luta que se avizinha focar-se-á nas cidades, onde se concentra a maior parte das empresas e dos empregos. Nas economias cujos indicadores permanecem fracos, são as nossas cidades que revelam as taxas mais elevadas de desemprego. De igual modo, é nas nossas dinâmicas áreas urbanas que a esperança de crescimento do emprego e das empresas é maior.

A UE tem vindo a identificar de forma consistente o papel-chave que as cidades desempenham na agenda para as competências e empregos. A corroborar esta afirmação está uma longa história de diretivas e declarações macropolíticas. A mais recente foi o lançamento da iniciativa Jobs and Skills Partnership (Parceria para o Emprego e Competências), integrada na Agenda Urbana para a União Europeia. Outra é a Nova Agenda de Competências para a Europa, que propõe um plano de 10 pontos para melhorar as competências dos cidadãos da UE, sobretudo ao nível mais básico.

Mas o que significa isto na prática? Este artigo explora os desafios e oportunidades que as cidades enfrentam no âmbito da agenda para as competências e o emprego. Será dada especial atenção às previsões de crescimento – também este cada vez mais contestado enquanto conceito positivo. Ao fazê-lo, o artigo abordará o conceito de Nova Economia, e aquilo que Jeremy Rifkin descreveu como a Terceira Revolução Industrial. Sob este cenário, precisaremos de repensar radicalmente a forma como preparamos os nossos cidadãos para o que se avizinha.

Analisaremos de que forma a Parceria para o Emprego e Competências pode ajudar as cidades a ajustarem-se a esta mudança radical da economia. Por fim, o artigo refletirá sobre o trabalho de vanguarda que as cidades estão a desenvolver nesta área, considerando ainda a possível contribuição do Programa URBACT.

A Nova Economia e a Nova Agenda de Competências para a Europa

Como sempre, existem boas e más notícias. A boa notícia (de acordo com Rifkin e outros) é que a convergência da tecnologia da Internet e as energias renováveis tem o potencial de transformar o modelo económico que prevalece há mais de 100 anos. Esta mudança contempla a transição dos combustíveis fósseis para as energias renováveis, transformando edifícios em geradores de energias limpas e resultando, em consequência, numa drástica redução dos encargos energéticos. Mais importante, inclui igualmente o potencial da Internet das Coisas, que permite a comunicação entre todos os dispositivos.

Juntos, têm o enorme potencial de promover a mudança transformadora, por exemplo, nos setores da logística e da mobilidade. A criação de um novo sistema energético serve de enquadramento a esta revolução. A energia é carregada pelos edifícios, parcialmente armazenada sob a forma de hidrogénio, distribuída através de sistemas Internet de eletricidade “verde” e ligada a uma rede de transporte com emissões zero. Os agregados familiares são transformados em produtores de energia, com um potencial de ganho proveniente das tarifas de alimentação (tarifas feed-in). Os cidadãos passam a ser simultaneamente produtores e consumidores de energia. As perspetivas são empolgantes e potencialmente transformadoras de paradigma.

Ao mesmo tempo, Rifkin e outros identificaram o crescimento do movimento Commons como o lubrificante social necessário a este novo paradigma económico. Facilitada pela Internet e pelos princípios do movimento Open Source (que remetem para os modelos de transação pré-capitalistas), a estrutura de partilha dos recursos foi reinventada. As ferramentas de comunicação digital e social estão a ajudar a redefinir os modelos de colaboração e a catalisar a mudança para as redes horizontais. A economia social, até à data um setor relegado para segundo plano, poderá finalmente ver a luz do dia, sobretudo pelo facto da geração Millenials dar prioridade à qualidade de vida em detrimento da compensação financeira.

Até aqui tudo bem. É possível, contudo, que em certos locais da Europa, estas elaboradas descrições soem a ficção científica. De facto, mesmo nas nossas cidades mais avançadas, uma proporção significativa dos nossos cidadãos continua a não estar preparada para o que se avizinha, e até para aquilo que está a acontecer neste preciso momento. Isto aplica-se aos nossos sistemas de educação, cujos esforços de adaptação são visíveis desde o aparecimento da Internet e do advento da economia digital. Ao utilizarem um tablet, as nossas crianças conseguem adquirir mais conhecimentos numa hora do que num dia inteiro de escola.

Do outro lado da escala demográfica, temos um mercado de trabalho com uma mão-de-obra cada vez mais envelhecida. Do lado positivo, isto deve-se à melhoria dos parâmetros de saúde. Do lado negativo, as pessoas são forçadas a trabalhar durante mais tempo devido à inadequação das pensões que lhes são atribuídas. A juntar a esta situação, temos recém-chegados às cidades da Europa que vêm em busca de um futuro. Estes chegam carregados de esperança, energia e resiliência. O desafio reside em encontrar formas de lhes permitir ter um contributo ativo nas nossas economias.

Em suma, é isto que enfrentamos. Por um lado, vivemos uma nova e excitante era de oportunidades. Por outro lado, as qualificações de uma proporção significativa da população europeia são tão baixas que põem em risco as suas perspetivas de futuro. De acordo com os dados mais recentes da UE, 1 em cada 5 adultos possui um baixo nível de literacia, quase 1 em cada 4 um nível baixo de numeracia e 2 em cada 5 (41 %) não possui competências digitais básicas. Ao mesmo tempo, estes mesmos dados indicam que 2 em cada 5 empregadores sentem dificuldades em encontrar trabalhadores com as competências que procuram.

O desafio que temos pela frente é, portanto, evidente: como transformar o modo como educamos e formamos os nossos cidadãos de modo a que a Europa possa aproveitar o potencial destas excitantes oportunidades?

Como estão as cidades europeias a responder?

Em finais de setembro, no âmbito da rede Eurocities, a cidade de Roterdão recebeu um evento destinado a examinar esta questão em detalhe. Tal como a cidade anfitriã, Gand, Viena, Munique, Malmo, Nantes e Birmingham também desempenharam um papel ativo no debate franco e ativo que se desenvolveu. A estas juntaram-se outras vozes fundamentais e interessadas na evolução do emprego, incluindo a Comissão Europeia (DG Emprego, Assuntos Sociais e Inclusão), a OCDE e intervenientes do setor privado, tais como o Randstad Group.

Uma série de temas comuns foi transversal às questões colocadas pela cidade e ao subsequente debate. O tema mais importante foi a necessidade de conciliar a cadeia de fornecimento de serviços de educação e competências com as necessidades em rápida transformação das nossas economias avançadas. Os factos apresentados pela OCDE e pelo Grupo Randstad ilustraram o desfasamento e o crescente desafio que temos à nossa frente. O estudo sobre as futuras necessidades de competências, elaborado pelo Fórum Económico Mundial foi citado por participantes de Roterdão e da Região Metropolitana de Haia. Daqui se depreende que a “resolução de problemas complexos”, o “pensamento crítico” e a “criatividade” serão as três principais competências exigidas em 2020. Como indica o quadro infra, a “criatividade” é a competência que mais terá de mudar.

Esta questão tem claras implicações no setor educativo, as quais estão a ser abordadas com diferentes níveis de sucesso. Se queremos que as nossas crianças adquiram as competências de que precisarão no futuro, é fundamental apostar numa modernização a montante dos programas curriculares. Por exemplo, terá de ser dada maior atenção a atitudes-chave como o empreendedorismo, a criatividade e a inteligência emocional, fundamentais para o modelo da Nova Economia.

Este desafio também se aplica à governação. De que forma garantem as cidades uma harmonização e adaptação perfeitas dos seus sistemas de aprendizagem? A equipa de Roterdão explicou de que forma está a cidade a responder ao desafio através da constituição do Next Education Group. Esta abordagem criou três domínios (estabelecimentos de ensino, organismos de economia social/inovação e setor empresarial) com o objetivo de envolver os intervenientes-chave na conceção conjunta de novos modelos e estruturas de trabalho.

A vizinha cidade de Gand está a lidar com estas matérias de forma pró-ativa. Recentemente, levou a cabo uma iniciativa assente na exploração de talentos necessários à futura economia da cidade. A interação com profissionais proeminentes da área dos recursos humanos na cidade veio confirmar o declínio das oportunidades existentes para os trabalhadores com poucas qualificações devido à automação e à inovação. Revelou, ainda, a necessidade de se dispor de um modelo de parceria sofisticado na cidade, assente na utilização de ferramentas prospetivas e numa inteligência partilhada, por forma a antecipar os requisitos de qualificações. De entre as componentes fundamentais desta abordagem incluem-se a colaboração com as empresas, com vista a reforçar a flexibilidade e a resiliência; a especialização inteligente, sobretudo no que respeita às economias circular e social; e o apoio aos promotores da economia local.

Além de se considerar a disponibilização futura de competências, existe uma discussão mais alargada sobre os níveis de qualificação dos adultos que já integram o mercado de trabalho. Esta questão é evidenciada nos dados da UE que destacam os desafios relacionados com as competências de base. Num mundo em que as pessoas têm vários empregos em simultâneo, os cidadãos terão de gerir transições e melhorar constantemente as suas qualificações. A aprendizagem ao longo da vida, tantas vezes apenas um cliché, terá de ser a norma se os europeus quiserem acompanhar as mudanças no mundo do trabalho.

Esta necessidade de requalificação profissional é transversal a todos os setores da indústria, bem como a todos os níveis profissionais. A Nova Economia trará mudança a todos os níveis, já evidentes no impacto da automação e da evolução tecnológica. O crescimento controverso da Economia Gig, liderado por empresas como a Uber e a Airbnb, já está a transformar os setores dos transportes e hoteleiro. Mesmo nos setores tradicionalmente constantes, como os setores da saúde, educação, finanças e serviços jurídicos, a evolução tecnológica está a abalar o emprego a todos os níveis.

Apesar de tudo, estão a ser criadas novas oportunidades. Simultaneamente, verifica-se uma procura crescente em certos setores e para certos serviços que não podem ser descentralizados ou inteiramente substituídos por tecnologia. O envelhecimento demográfico na Europa, por exemplo, tem vindo a aumentar as oportunidades no setor dos cuidados pessoais. Por exemplo, o Panorama de Competências da UE prevê a criação de mais de 104 milhões de postos de trabalho no setor dos cuidados pessoais e de saúde entre 2013 a 2025. Muitos destes novos postos de trabalho são no setor do apoio domiciliário que está em crescimento e é determinante para ajudar os idosos a ter uma vida independente.

As cidades europeias continuarão, portanto, a oferecer oportunidades a todos os níveis de competências. Este é um elemento importante da agenda para a igualdade, que reconhece a importância de criar alternativas de percurso profissional como forma de minimizar o risco de aumentar as desigualdades nas nossas cidades. O presidente da Câmara de Roterdão, Aboutaleb, partilhou connosco uma visão poderosa deste mesmo desafio. Pegou no exemplo de uma mulher somali que sai do seu conturbado país com duas crianças pequenas e enfrenta enormes desafios no seu percurso através do Médio Oriente e da Turquia. Chegada aos Países Baixos, é-lhe dito que não possui competências relevantes e é encaminhada para uma vida de dependência da assistência social, apesar da evidente resiliência e capacidade de resolução de problemas que demonstrou para chegar ao seu destino. Aboutaleb argumenta que, se quisermos otimizar as potencialidades dos nacionais de países terceiros, é necessário que as nossas cidades apostem fortemente em melhorar o seu processo de transição.

Que contributo pode dar a Parceria para o Emprego e Competências da Agenda Urbana da União Europeia?

O exemplo do presidente Aboutaleb colocou em evidência a importância das cidades na Agenda para as Novas Competências da Europa. No início deste ano, a resposta da rede Eurocities ao plano de 10 pontos da Comissão veio reforçar esta afirmação. Em determinados pontos, como a Garantia de Competências e a Ferramenta de Perfil de Competências para Nacionais de Países Terceiros, o papel potencial das autoridades urbanas é evidente. É nas nossas áreas metropolitanas, onde vive a maioria dos nacionais de países terceiros, que a questão das competências coloca mais desafios e onde está também localizado o maior reservatório de conhecimentos especializados.

É impensável contemplar o desenvolvimento da Nova Agenda de Competências sem a participação ativa e influente das principais cidades europeias. O mesmo se verifica com a recente Parceria para o Emprego e Competências, integrada na Agenda Urbana para a União Europeia. À semelhança do que acontece com outras parcerias já estabelecidas, estas devem assentar em factos concretos e significativos. Para serem eficazes, terão de centrar a sua ação no apoio a novas e inovadoras formas de trabalhar (as cidades europeias necessitam de exemplos concretos de como enfrentar os novos desafios) e não em análises adicionais à escala e natureza do problema.

É encorajador ver que Roterdão participa de todo este processo, sobretudo uma vez que o seu projeto recentemente aprovado no âmbito das Urban Innovative Actions lida com estes mesmos assuntos. É provável que várias cidades URBACT venham também a contribuir ativamente nesta matéria.

O contributo do URBACT para o debate

O programa URBACT também tem um papel potencialmente importante a desempenhar. O mesmo já produziu evidências importantes relacionadas com as questões de governança, competências e empregos. O seu relatório de trabalho inicial sobre inovação social, cidades e emprego juvenil, analisou a evolução do papel das autoridades urbanas. Na sequência dessa análise, o grupo de trabalho para a temática Jobs Generation for a Jobless Generation identificou as alavancas disponíveis na cidade para moldar a agenda relativa aos empregos e às competências. No mesmo processo, o programa produziu dados importantes através do grupo de trabalho para as novas economias urbanas. Cada um desses dados proveio claramente da mobilização das redes de cidades por toda a Europa no âmbito do programa URBACT, as quais fornecem uma plataforma vital para o intercâmbio, a aprendizagem e o reforço de capacidades.

No quadro do Programa URBACT II, projetos como My Generation, My Generation at Work, EUniversities e ESIMEC forneceram importantes lições em redor deste tema. No âmbito do programa URBACT III, uma nova geração de redes dá seguimento ao trabalho iniciado. Estas incluem a Resilient Europe, liderada por Roterdão, a TechTown, liderada por Barnsley e a Gen Y City liderada por Poznan.

Desta forma, o programa URBACT oferece uma ligação em tempo real entre o debate de alto nível sobre a Nova Economia, Empregos e Competências, e a realidade prática de conceber soluções e testar novas formas de trabalhar. Ainda este ano, o concurso de boas práticas permitirá criar uma esfera adicional de inteligência, mais uma vez com um enfoque prático, na medida em que o programa URBACT lança as novas redes de transferência. A complementar tudo isto, estará o trabalho contínuo de reforço de capacidades do URBACT, o qual concederá aos intervenientes urbanos os conhecimentos e competências necessários para aproveitar ao máximo as oportunidades criadas.

No futuro, juntamente com outras plataformas-chave – incluindo a rede Eurocities e a Iniciativa Urban Innovative Actions – o URBACT poderá tentar assegurar que a nova Parceria para o Emprego e Competências tenha como base a experiência, com enfoque nas necessidades das cidades e nos grandes desafios que se avizinham.

Eddy Adams

 27 de outubro de 2016

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