Entrevista a Ana Tomás e Dina Moreira | projeto ARRIVAL CITIES | CM Amadora | nov. 2016
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09 January 2017A Ana Tomás é Técnica Superior de Serviço Social no Gabinete de Projetos Especiais da Câmara Municipal de Amadora e, desde o arranque da rede ARRIVAL CITIES, a sua coordenadora transnacional.
A Dina Moreira é Coordenadora do Gabinete de Projetos Especiais e gestora de estratégia do referido projeto.
Começo por colocar a mesma pergunta a ambas. Já alguma de vocês tinha tido contacto com o programa URBACT, antes de iniciarem esta experiência recente?
Ana Tomás – Eu estive envolvida, embora de forma lateral, numa das ações promovidas pelo projeto piloto MILE (PO URBACT II), assim como na organização de um encontro no âmbito desse projeto. O município de Amadora foi um dos parceiros envolvidos, entre 2007 e 2009. Esta rede temática teve como objetivo apoiar as cidades no desenvolvimento de um programa de intercâmbio focado na “Gestão da imigração e integração a nível local”.
Dina Moreira – Contrariamente à minha colega, eu nunca tinha estado envolvida num projeto URBACT.
Atualmente a Amadora participa numa rede APN (Action Planning Network), a ARRIVAL CITIES, como líder da parceria. Qual foi o caminho percorrido que permitiu o município chegar até aqui?
A questão que coloca prende-se com a experiência anterior adquirida na temática da integração dos imigrantes, espelhada não só na participação no projeto anteriormente referido, como em vários outros, de que o “Não alimente o Rumor” é o mais emblemático.
Este projeto, que teve como parceiro principal o Conselho da Europa, reuniu um conjunto alargado de cidades europeias de diversos países e decorreu entre janeiro de 2014 e junho de 2015. A criação de uma rede anti rumores em cada cidade, envolvendo a administração pública, as organizações sociais e os cidadãos foi o mote para a constituição de “agentes anti rumores” na luta contra crenças incorretas, estereótipos e preconceitos comuns que têm como alvo a população imigrante e as minorias étnicas.
Embora já sem financiamento comunitário, a campanha prosseguiu no terreno e constituiu um fator de alavancagem para a proposta da atual rede URBACT, acarinhada pelo poder político local.
Por outro lado, o Plano Municipal para a Integração de Imigrantes 2015-2017, que contou com financiamento do Alto Comissariado para as Migrações, contribui, seguramente, para o desenho do futuro plano de ação URBACT.
E os projetos que mencionaram tiveram divulgação pública?
No que se refere ao projeto “Não alimente o Rumor”, desenvolvemos uma campanha ambiciosa, pois pretendemos alterar a imagem quer dos imigrantes, quer do próprio município, que ainda é muito negativa.
Foram realizados 3 vídeos, em português e inglês: um de apresentação geral do projeto; o segundo, a que chamámos memorial do projeto, contém a síntese das ações; o último é um registo de testemunhos de imigrantes. Estes vídeos foram produzidos pela TV Amadora e podem ser visionados no Website e na página do Facebook do projeto ou, ainda, no YouTube. Também foi feita a sua divulgação num workshop organizado pela Rede Portuguesa das Cidades Interculturais.
Consideramos, ainda, que a divulgação deste tipo de ações tem que ser feita em permanência e estar ancorada num compromisso político forte.
Voltando à ideia da constituição da rede ARRIVAL CITIES, tiveram muitas propostas de adesão por parte de outras cidades europeias?
Sim, a proposta gerou imediatamente uma reação positiva, com um número muito elevado de cidades, mais de quatro dezenas, a querer integrar a parceria. A escolha de parceiros não foi fácil, mas a orientação do URBACT no sentido de ter uma boa cobertura geográfica, a necessidade de incluir cidades que se debatem com os desafios gerados pelos fluxos migratórios, bem como o claro interesse nas questões da imigração e dos refugiados, foram importantes na tomada de decisão.
E assim temos uma parceria que inclui cidades de países do Sul (Espanha, Grécia, Itália e Portugal), em que a problemática dos refugiados é cada vez mais premente, mas também do Centro (França e Alemanha) e do Norte (Finlândia e Letónia). Nestes dois últimos países, tem-se verificado um aumento das atitudes negativas face aos imigrantes. Na Letónia o número de nacionais de países terceiros com autorização de residência temporária triplicou entre 2009 e 2015 e Vantaa, na Finlândia, está a receber novos fluxos de migrantes, refugiados de conflitos na Síria, Afeganistão e Iraque.
Como têm decorrido as relações com os restantes parceiros e o perito temático? E que benefícios retiram das reuniões transnacionais?
Até ao presente, já realizámos três reuniões presenciais do Steering Group (SG) e um Workshop Temático Transnacional (WT). As reuniões do SG são de coordenação entre os vários parceiros, no sentido de definir as linhas mestras do caminho a tomar. Decorrem em diferentes cidades mas, infelizmente, não vai ser possível cobrir todo o universo da parceria em termos geográficos. Também já utilizámos o Skype em situações de impossibilidade da presença física de alguns parceiros e temos, ainda, previsto organizar conferências online.
Quanto aos WT, eles são organizados em torno de temas relacionados com as preocupações que as cidades querem ver refletidas nos seus planos. Trata-se de eventos mais abertos, com outra dinâmica e que incluem visitas de estudo. O primeiro WT teve como tema a construção da coesão social relacionada com o combate aos estereótipos e preconceitos e à inclusão de recém-chegados à cidade. O segundo WT, a realizar em janeiro de 2017, em Vantaa, terá enfoque na integração laboral de imigrantes e refugiados.
O papel do perito temático é fundamental e o nosso tem grande experiência na temática da rede e na articulação transnacional. É ele que produz o documento enquadrador do tema em análise, a partir do qual os parceiros apresentam as questões a ser trabalhadas e as propostas de ações a desenvolver.
A mais-valia do intercâmbio com outras cidades é a oportunidade de percebermos como elas estão a lidar com problemas semelhantes ao nosso, quais as estratégias que estão a implementar, contribuindo com isso para a melhoria da nossa intervenção no território da Amadora.
Dentro da parceria, conseguem identificar uma cidade que vos seja particularmente inspiradora na sua atuação?
Todas as apresentações feitas no âmbito do WT foram muito interessantes, mas o caso da cidade de Dresden, na Alemanha, foi o que mais nos marcou, tendo em conta as preocupações da Amadora e a nossa campanha “Não alimente o Rumor”. A cidade de Dresden lida de perto com a questão dos medos dos imigrantes, num contexto já com tradição de debates públicos alargados, dinamizados pela Cruz Vermelha local. Trata-se de um movimento informal, liderado pela sociedade civil.
E como encara a Ana o exercício de liderança da parceria? Considera particularmente difícil?
Eu diria que mais do que difícil, é um desafio diário muito enriquecedor. Nunca tinha coordenado um projeto internacional com estas características, mas as relações pessoais e institucionais que se estabelecem fazem deste um papel especial, particularmente interessante.
Para terminar, tenho uma última questão a colocar à Dina, visto que foi a única das duas a participar na URBACT Summer University (USU). Como descreve essa experiência?
Achei a USU muito interessante. A ideia de criar uma cidade virtual – Avalon – pareceu-me fantástica, pois assim ninguém teria a tendência para transpor os problemas da sua cidade para o trabalho de grupo realizado no âmbito da USU.
A organização foi excelente, sobretudo, atendendo ao elevado número de participantes e quantidade de trabalho exigido em tão poucos dias.
O evento foi muito intensivo, mas considero, a esta distância, que não poderia ter sido de outra forma, atendendo aos objetivos a que se propunha. Relevo, ainda, a entreajuda estabelecida entre os participantes dos grupos de trabalho, bem como o ambiente informal que trespassou todo o evento.
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