Como planear comunidades saudáveis e ativas: aprender através de um “mergulho profundo”
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26 March 2018Comunidades saudáveis e ativas são parte integrante de uma cidade inteligente e devem ser planeadas. O planeamento urbano desempenha um papel crucial na facilitação de redes e na disponibilidade de espaços que incentivem os cidadãos a participarem em atividades físicas. Espaços públicos bem concebidos não se limitam a ser acrescentos atrativos à paisagem urbana, são também um incentivo para que as pessoas passem mais tempo ao ar livre, em convívio.

A Rede de Planeamento de Ação VITAL CITIES explorou a possibilidade de combater a exclusão social através de uma nova conceção dos espaços públicos em áreas residenciais desfavorecidas. O projeto procurou encontrar ferramentas inovadoras e soluções infraestruturais de baixo custo para criar ambientes propícios à atividade.
No âmbito da partilha de conhecimentos e da criação de capacidades, as cidades participantes atravessaram um processo denominado de “mergulho profundo”, uma abordagem em três fases à aprendizagem transnacional e à partilha de boas práticas. Cada cidade participante recebeu parceiros para os ajudar a compreender as suas atuais forças e fraquezas na promoção da atividade física, bem como para explorar opções de melhoria futura.
Três passos para a abordagem de "mergulho profundo": da autoanálise à análise pelos pares
O “mergulho profundo” consiste na elaboração de uma autoanálise por cada cidade, seguida pela organização de uma análise pelos pares através da visita de uma equipa de representantes de outras cidades parceiras. A cidade anfitriã mobiliza as partes interessadas a nível local para um seminário colaborativo de dois dias com os visitantes sobre a área alvo do projeto. O objetivo é fornecer um relatório à cidade anfitriã que inclua perguntas, reflexões e sugestões para análise, melhoria e aperfeiçoamento do plano local de ação integrado.
Passo 1: Autoanálise
Na primeira fase, a cidade anfitriã – juntamente com as partes interessadas do Grupo Local URBACT – realizam aquilo a que, na rede, se chama um “processo de autoavaliação”. As partes interessadas são incentivadas a perguntar e a responder a questões críticas sobre o desenvolvimento e a execução de políticas locais. Este exercício visa avaliar e rever as atuais práticas, identificando o nível de infraestruturas existente para apoiar a atividade física, questionando o conhecimento e os dados sobre a cidade. Para cada cidade, esta análise é orientada para uma área alvo específica, centrando-se em três temas essenciais: “políticas, planeamento e monitorização”, “financiamento e gestão” e “aspetos sócioespaciais”.
Através da autoavaliação, os participantes reúnem toda a informação disponível, circunscrevem os desafios e identificam os dados em falta.
Ao invés de olharem para um único projeto, os grupos analisam em mais pormenor todo o ciclo político por trás do projeto. O lugar da autoanálise neste ciclo político mais alargado pode ser descrito como se segue:
Conforme descrito na figura em cima, parte do processo de autoanálise implica que as cidades analisem se possuem a informação e os processos de monitorização adequados para compreender as respetivas infraestruturas de apoio à atividade física. As partes essenciais do processo exigem o levantamento das infraestruturas existentes de apoio à atividade física, programas e planos associados, bem como a identificação do comportamento e das exigências do utilizador.
Passo 2: Visitas aos parceiros pelas equipas de “mergulho profundo”!
No processo, cada cidade compôs uma pequena equipa de “mergulho profundo” recrutada a partir das partes interessadas a nível local, com um coordenador a facilitar todo o processo de entrada e saída de visitas.
Na segunda fase, estas equipas de “mergulho profundo” visitaram as cidades anfitriãs e observaram a autoanálise e o processo que está na base da mesma. As equipas de “mergulho profundas” são compostas por delegações de duas cidades parceiras VITAL CITIES, selecionadas pelas respectivas competências na área na qual a cidade visitada necessita de aprender mais. As equipas de “mergulho profundo” assumem a posição de peritos externos. Fornecem sugestões criativas para os problemas identificados na área, partilham boas práticas inspiradoras e destacam problemas que devem ser considerados pela cidade anfitriã.
Passo 3: Relatórios das visitas servem de suporte aos Planos de Ação Integrados
As equipas de “mergulho profundo” sintetizam os resultados e as recomendações das visitas num relatório. O relatório destaca as principais áreas nas quais as cidades se devem concentrar para solucionarem os seus problemas específicos. As recomendações são, então, utilizadas como uma peça fundamental na qual se baseiam os Planos de Ação Integrados (PAI), juntamente com o perfil da cidade, o local em que incide a análise efetuada pelo grupo das partes interessadas a nível local, uma análise SWOT, etc.
O processo de mergulho profundo ajuda as cidades a melhorar:
» A recolha e análise dos dados
Com a autoavaliação, as cidades descobriram que uma grande parte dos dados necessários para a análise já existia nas cidades, mas estavam na posse de várias partes interessadas, sendo que os dados precisam de ser frequentemente atualizados e analisados em detalhe. Um dos principais resultados foi a recolha de novas informações sobre as atividades do utilizador, juntando conjuntos de dados já existente na autarquia e noutros organismos públicos.
» A coordenação das partes interessadas
Apesar de uma crescente cultura de colaboração e de coplaneamento nas administrações públicas, o processo demonstrou que a participação continua a ser um desafio.
Os cargos profissionais associados ao desporto e às atividades físicas estão, frequentemente, dispersos por vários departamentos, que mantêm o hábito de resolver os problemas dentro da sua própria equipa em vez de estabelecerem um diálogo com as várias partes interessadas.
A coordenação dos vários campos associados à atividade física exige uma colaboração entre as várias partes interessadas que podem estar a trabalhar, atualmente, de forma desarticulada. A tomada de decisões estratégicas requer que se vá além do nível de bairro, por vezes mesmo até ao nível regional ou mesmo nacional.
Graças à abordagem de “mergulho profundo”, a rede Vital Cities foi incentivada a refletir sobre a sua forma de trabalhar, melhorando simultaneamente a ligação inexistente entre as partes interessadas e os processos de tomada de decisão.
» A comunicação com os residentes
O processo de “mergulho profundo” também permitiu concluir que a comunicação com o público deve ser mais eficiente, sendo aqui público uma alusão a outras pessoas potencialmente interessadas nas questões tratadas, mas sem o direito a participar em reuniões. Os participantes mais diligentes manifestaram, em diversas situações, a sua insatisfação e alguma saturação face ao processo, devido à energia requerida para participar nas reuniões regularmente.
O processo de “mergulho profundo” indicou que, ao invés de longas e numerosas consultas, a comunicação deveria revestir uma forma simples e a enfâse deveria recair sobre os comentários e a implementação. Os cidadãos devem ser incentivados a assumir maior protagonismo e envolverem-se mais em pequenas ações, utilizando diferentes técnicas de participação.
Os profissionais devem aprender como alcançar as comunidades de forma mais eficiente – incluindo jovens e idosos –, através de ligações existentes, clubes, escolas, universidades e da comunicação social. Uma vez efetuado o contacto, a atividade física pode ser promovida como forma de atividade social e incentivada através de diferentes recompensas (por exemplo, acesso gratuito, pontos de bónus para outros serviços públicos, como no domínio da cultura, etc.). A cidade de Birmingham oferece um esquema de incentivos deste tipo aos seus cidadãos.
» As intervenções em pequena escala
As intervenções em pequena escala podem ter início de imediato e ter um impacto positivo, uma vez que não necessitam de muito dinheiro. Relativamente ao combate ao vandalismo, é de considerar a utilização de materiais reciclados e de origem local, que são mais sustentáveis e podem ser facilmente substituídos. Por exemplo, no bairro de Karosta, em Liepaja, Letónia, as raparigas manifestaram a necessidade de instalações que pudessem utilizar junto a um campo de futebol que é habitualmente mais utilizado por rapazes. Por conseguinte, foi instalado um campo de voleibol ao ar livre. Este inclui apenas uma rede e linhas pintadas no chão, no espaço público.
» A partilha de responsabilidades
Ao centrarmo-nos na implementação, a partilha de responsabilidades parece ser um dos maiores desafios. A promoção da atividade física envolve esforços significativos e os organizadores de atividades desportivas – públicos e privados –, necessitam de participar na criação de estratégias, angariação de fundos, trabalho com comunidades e a assunção de responsabilidades pela manutenção, envolvendo os setores público, privado, voluntário e académico.
"Mergulho profundo": um processo de aprendizagem muito útil
As conclusões do processo de “mergulho profundo” referem que os planos de ação baseados na área necessitam de ser integrados numa estratégia para toda a cidade e serem apoiadas por um leque mais alargado de partes interessadas. Os bairros desfavorecidos e os respetivos cidadãos devem fazer parte destas estratégias e formar parte integrante do movimento cidades saudáveis.
As autoridades municipais e os políticos apreciaram muito o processo, conforme afirmaram na sessão preliminar de acompanhamento, que concluiu cada visita de “mergulho profundo”.
«É impressionante como a delegação visitante descobriu tanta informação detalhada durante dois dias, enquanto nós próprios passamos cinco meses com ajuda externa para chegarmos a conclusões muito menos pormenorizadas», referiu um autarca do Distrito XIII de Budapeste.
«Parece que estamos a atingir a meta, mas a esquecer o essencial», afirmou um autarca de Birmingham.
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Texto da autoria de Twan De Bruijn, apresentado em 25 de janeiro de 2018
Submitted by Ana Resende on