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Atenção a todos os decisores urbanos! Sabiam que podem fazer negócios sem dinheiro?

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15 September 2020
Read time: 4 minutes

Todos nós queremos que os serviços urbanos sejam eficientes, que o desenvolvimento seja interessante, que os eventos cívicos sejam animados e que as novas iniciativas urbanas sejam realmente capazes de fazer a diferença! Mas como fazer isto quando muitas cidades europeias - especialmente depois das duras crises da última década - carecem de financiamento, recursos, conhecimento e ligações que possibilitem que o trabalho das administrações seja tão vibrante? Há uma resposta que o pode surpreender. Podemos recorrer às nossas comunidades empresariais, porque existe algo chamado Responsabilidade Social das Empresas (RSE)

A RSE pode ser definida, em termos gerais, como "a responsabilidade das empresas pelos seus impactos na sociedade" (Comissão Europeia, 2019). A ideia é que as empresas integrem preocupações sociais e ambientais nas suas operações, numa base voluntária, respeitem os direitos humanos onde quer que produzam os seus bens e serviços, tratem bem os seus empregados, não poluam o ambiente e não sejam corruptas. Em poucas palavras: empresas responsáveis. Soa familiar, mas onde está a ligação às cidades, comunidades e serviços cívicos?

 

É aqui que entra a nova rede de Planeamento de Ação URBACT. Oficialmente designado 'CITIES4CSR', este projeto pancontinental de 10 cidades está numa posição única para explorar de forma prática o modo como a RSE pode fazer a diferença nas nossas sociedades urbanas. Utilizando princípios, métodos e ferramentas URBACT comprovados, pretende apoiar a elaboração, teste e implementação de "estratégias municipais abrangentes para promover e estimular a responsabilidade empresarial nas áreas urbanas". Por outras palavras, o seu objetivo é trabalhar para a realização de uma nova visão em todo o continente europeu: cidades não como lugares onde as administrações locais governam de cima para baixo, mas como lugares onde o governo e as empresas partilham responsabilidades urbanas! Queremos mostrar como a Responsabilidade Social das Empresas pode ser elevada a um novo nível: Responsabilidade Urbana das Empresas.

 

O que torna a nossa abordagem de certa forma única, em comparação com outras redes, é o facto das cidades participantes não terem, acima de tudo, uma preocupação com a existência de um problema urbano em particular. Trata-se antes de constituir um conjunto de instrumentos locais específicos de RSE que ajudem a desafiar o status-quo local em domínios políticos muito diferentes. Tal como uma empresa de construção pode utilizar as suas máquinas, pessoas, experiência e know-how para construir uma estação de comboio numa cidade, uma torre de televisão na cidade seguinte e um centro comercial noutra cidade ainda, os nossos esforços conjuntos podem desencadear transformações benéficas em diferentes domínios políticos e em diferentes cidades. Na realidade, é exatamente aí que as cidades sentem que a necessidade é mais premente.

 

Assim, poderá acrescentar-se valor à reabilitação urbana, proteção ambiental, coesão social ou políticas educativas, só para citar alguns exemplos. A forma como as aspirações, os recursos e a liderança do setor empresarial local - em parceria com a administração local e outras partes interessadas – vai estar no cerne da mudança constitue o elemento aglutinador entre as cidades e o interesse comum.

 

A responsabilidade social das empresas não é naturalmente um conceito novo. Os debates académicos associam a ascensão da RSE a cinco transformações societais: sociedades mais prósperas, preocupações crescentes com a sustentabilidade, intensificação da globalização, reforço do papel dos meios de comunicação social e marcas em ascensão (Chandler e Werther, 2013). De referir ainda que a RSE pode ser implícita, isto é, presente nos valores, normas e regras das sociedades, ou explícita, abrangendo programas e estratégias voluntárias das empresas com base no seu próprio critério (Matten e Moon, 2008). Em toda a Europa parece haver um desnível em termos de RSE, dado que políticas mais progressistas na Europa Ocidental, Escandinávia e países anglo-saxónicos não foram igualmente partilhadas pelos governos da Europa Central e Oriental (Steurer, 2015).

 

A boa notícia é que não temos de esperar que as empresas se empenhem nos assuntos urbanos, uma vez que as administrações locais podem ser incrivelmente pró-ativas, dispondo já de um conjunto de instrumentos de política RSE de eficácia comprovada, desde iniciativas de sensibilização para espalhar a palavra sobre a RSE até estratégias de contratação que exigem que os fornecedores cumpram certos critérios ambientais e sociais. Portanto, não é necessário reinventar a roda. Igualmente, encontrar a solução certa para a RSE pode significar enfrentar questões de confiança profundamente enraizadas entre as autoridades públicas e as empresas e diferenças em termos de linguagem corrente, hábitos de trabalho e horizontes de planeamento. Por outras palavras, não devemos ficar surpreendidos por encontrar lacunas de vários tipos, conceções erradas e obstáculos neste nosso projeto.

 

Quais são então as dez cidades que aceitaram este desafio? O parceiro líder é Milão (Itália), uma cidade com grande experiência na gestão de projetos europeus, que tem como parceiras as seguintes cidades: Sofia e Vratsa (Bulgária), Kekava (Letónia), Rijeka (Croácia), Molina de Segura (Espanha), Guimarães (Portugal), Budaörs (Hungria), Bratislava (Eslováquia) e Nantes Métropole (França). A rede cobre de uma forma relativamente abrangente diferentes partes geográficas da Europa, incorporando administrações locais de diversas dimensões. De salientar ainda o facto de entre os parceiros estarem a Cidade Europeia da Inovação 2019 (Nantes) e a Cidade Europeia da Cultura 2020 (Rijeka).

Esta rede destaca-se também por oferecer inúmeras oportunidades de estabelecer pontes institucionais. Por exemplo, com o Pacto Global das Nações Unidas, que constitui a maior iniciativa mundial de sustentabilidade empresarial. O seu braço urbano, o Programa do Pacto Global das Nações Unidas para as Cidades, promove a colaboração do setor privado e da sociedade civil com os governos regionais e locais, a fim de dar resposta a desafios globais complexos a nível local, implementando o chamado Modelo de Melbourne. As iniciativas de RSE podem também estar diretamente relacionadas com a Agenda Urbana para a União Europeia e com a Comissão Europeia. Finalmente, a perspetiva da CSR Europe é que, até 2030, a população urbana europeia, ou seja, três quartos da população total, viverá em cidades sustentáveis que lhes irão proporcionar oportunidades económicas, infraestruturas fiáveis e um elevado nível de vida.

O Modelo de Melbourne promove a colaboração intersetorial de resposta a desafios urbanos complexos (Fonte: UN Global Compact Cities Programme)

 

Os trabalhos entretanto já começaram. A rede teve a sua reunião de kick-off na bonita cidade de Milão, em setembro de 2019, com uma série de visitas bem organizadas ao terreno que permitiram a todos os participantes aprender muito sobre as iniciativas empresariais locais que, de uma forma muito concreta, ajudam as comunidades locais. Decorrem atualmente várias visitas de estudo com vista à produção dos baseline studies, estando a ser efetuada a análise dos problemas, e a serem desenvolvidas as primeiras ideias sobre soluções e ações de pequena escala. Assiste-se, igualmente, ao lento surgimento de grupos locais de partes interessadas multissetoriais.

 

 

"As PME´s estão tão ocupadas, tão concentradas em si mesmas e em ganhar dinheiro, que tendem a esquecer que não o podem fazer sem terem em atenção o mundo exterior. É crucial olhar para o exterior, e à nossa volta".

Jean-Marc Barki - Director Executivo, Sealock, French SM

 

É já evidente que uma das prioridades das políticas são as pequenas e médias empresas (PME), um setor que constitui frequentemente a espinha dorsal das economias urbanas e regionais europeias, mas que até agora raramente têm sido consideradas como membros da comunidade RSE. A reabilitação dos bairros, por outro lado, é outro dos objetivos do envolvimento das empresas. Estamos muito curiosos em saber até onde a procura por caminhos locais nos irá conduzir. Uma coisa é certa: as cidades podem ganhar muito quando se voltam para as partes interessadas nas empresas. Fazer negócios relevantes em prol do desenvolvimento urbano sem gastar dinheiro não tem de ser um conto de fadas!

 

O autor agradece o contributo da equipa de Milão, endereçando ainda um especial agradecimento a Giusy Chierchia por ter sugerido o título para este artigo!

 

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Texto da autoria de Steffen Wetzstein apresentado a 31 de janeiro de 2020